nov
11
2015

Um Brasil sem rumo

Abro a janela desta humilde casa em minha pequena propriedade no Sertão nordestino. O dia acorda quente, o Sol domina todos os espaços, faltam nuvens no céu, sobra anil. Fico a observar a vegetação ressequida pela longa estiagem. Meu rebanho se resume a cinco cabritos, o gado morreu todo. Tem também alguns frangos, um sevado no chiqueiro. O que sobra nesta desolação toda é a angustia que me devora de dentro para o exterior. Você sabe o que é acordar e não ter o que fazer? Sabe não. Como desejaria um trabalho árduo para meus magros braços. Careço de dinheiro, preciso alimentar minha esposa e meus filhos. Olhando esta natureza tento buscar uma ideia que me traga uma solução para o meu problema. Nem fome eu tenho mais, as tripas se enrolam na barriga pela ânsia que carrego. Não consigo encarar minha mulher, os olhos delas parecem me cobrar sempre algo que não possuo. Às vezes, os dois filhos me puxam pela surrada camisa, pedem algo para comer. É triste um pai ver os padecimentos baterem à porta e não possuir recursos para aliviar a dor. Tristemente tornou minha vida, peno dia e noite. Apenas peço um emprego. Quero trabalhar. Como pode um País tão gigante ignorar seus soldados em pleno campo de batalha? A existência tornou-se uma guerra velada para mim. Viver é penoso e difícil. Qual rumo tomar, alguém poderia me dá uma luz? Vou sair, vou para o mato, vou buscar mandacaru para servir aos bichos; depois vou ao açude apanhar água no balde; também cortarei um pouco de lenha. À tarde irei à cidade, quem sabe não encontro o que labutar, quem sabe não consigo algumas moedas para comprar uma rapadura. Enquanto isso, muitos jogam no lixo o que falta na mesa de uma legião de famintos. Tenho fome, infeliz! Tenho fome! Outros roubam o dinheiro da Nação para sustentar uma vida de luxo e vaidade. Tenho fome, cabra safado! Tenho fome! Vou sair, sair sem rumo, quem sabe não dou sorte e me aprumo. Sei não. Mulher, vou à cidade ver se consigo algo! Reze por mim, peça a Deus que ilumine meus passos. No caminho do calvário meu me detenho a conversar com o amigo João. Ele por muito penar conseguiu o benefício do Governo. O meu até hoje nada. Na cidade, os que detêm de farto recursos, todos eles, recebem. Recebe a esposa do vendeiro, a do açougueiro, a do vereador, a do secretário, recebem todos, menos este pobre que vive a se consumir pela fome. Por onde anda Deus que não ver tamanha desgraça? João me contou que só conseguiu após um acordo com o pessoal, a metade por seis meses ficará com eles. Melhor lamber que cuspir. Sem alternativa, vou aderir a esse comércio negro. A metade já é bem mais do que nada. Neste mundo, manda que pode, obedece quem tem juízo. Sou cabra, preciso comer.

Crônica de Zé do Bode.

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