maio
12
2014

Gilberto Brito conta como foi a vinda do Globo Rural a Paramirim

A carta abaixo, encaminhei ao Globo Rural em dezembro de 1984.
Como estava demorando alguma manifestação por parte deles, em determinado dia telefonei para o programa, quando um funcionário, chamado Celso, orientou-me para de vez em quando ficar remetendo cópia da mesma, até que em certo dia de sexta-feira do mês de março de 1987, eu trabalhando em Itaberaba, o velho Ulysses ligou-me: “o pessoal do Globo Rural telefonou, dizendo que estará aqui amanhã, para fazer a reportagem”.
Peguei o carro, cheguei à noite, quando fui informado que eles já se encontravam no hotel de Bráulio. Fui lá, conversei com Ivarci, Jorge e um outro que não me recordo o nome, para no dia seguinte iniciarem a reportagem, que fora concluída no domingo, quando eu não mais me encontrava em Paramirim, desde quando Waldir Pires tomaria posse, como governador, naquele mesmo domingo, e eu, como titular de um cargo regional do estado, teria que estar presente, no caso em Itaberaba.
No Domingo seguinte, 22/3, quando liguei a televisão para assistir à reportagem, em Itaberaba a Globo estava fora do ar. De pronto, liguei para um amigo em Salvador, que fez a gravação do programa, que só fui ver na quarta-feira. Quanto emoção.

A Carta ao Globo Rural:

Paramirim, 12 de dezembro de 1984.

Senhor redator,

Ouvinte assíduo de O Globo Rural, a cada domingo obtemos conhecimento dos mais diversificados, não só referente ao trato da agro-pecuária e tantas outras atividades relativas ao campo, como no aspecto comportamental do rurícula.

Satisfeito com as reportagens, notamos que o querido Nordeste, dádiva de amor, não tem sido objeto de programações, omissão por certo compreensível, desde quando estamos a produzir pouco, ruins que somos de céus.

Mas se males nos ocorrem, felicidades maiores nos ensinam e empolgam, fazendo-nos, cada vez mais, amantes da terra tão bem retratada por Euclídes da Cunha, nosso “Olho de raio X”.

PARAMIRIM, município encravado no sertão da Bahia, há 750 kms de Salvador, dotado de boa pista para pouso de aeronaves de pequeno e médio porte, oferece a vosso programa uma novidade relevante: as irrigações realizadas em terras que margeiam o Rio Paramirim, afluente maior da margem direita do São Francisco.

De origem chinesa, tal sistema de irrigação consiste de detalhes importantes, como sejam:

a) – um açude em aroeira (madeira de lei do sertão), que une uma margem à outra, isto possível pela superposição de enormes troncos-ganchos, atrelados por troncos lisos, também da mesma madeira;

b) – à proporção que as camadas vão sendo completadas, pequenas pedras são jogadas nas fendas verificadas, passando, com isto, a ocorrer a retenção das águas, às vezes com lâmina de 05 a 08 mts., por até 50 mts. de largura, dimensões médias de cada açude;

c) – em cada margem do açude nasce um sulco, popularmente conhecido como “rego mestre”, isto porque outros lhe são derivados, tendo, cada um deles, dimensão de até 10 Kms;

d) – dos regos menores seguem as águas para a irrigação das terras à jusante, procedimento que remonta a história do município, se constituindo um sustentáculo da região, desde quando nas terras irrigáveis, todas elas bem divididas e de ótima qualidade, se colhe arroz, feijão, milho e outros cereais, por três vezes ao ano, fato inédito em área tão sofrida e pouco assistida.

Oportuno é lembrar que as horas de irrigação de cada propriedade já se encontram pré-estabelecidas no seu respectivo título de domínio, escritura pública, muito raramente ocorrendo o desvio do líquido por parte de qualquer vizinho ou condômino, sendo isto regulamentado por uma cadeia sucessória de palavras, onde José sabe que a área de Antônio tem, de 15 em 15 dias, X horas d’água, para irrigação.

Tal riqueza enseja que essas terras estejam hoje no valor de CR$6.000.000,00 o ha. bem distribuídas em mini-fúndios, verdadeira reforma agrária natural, e possibilitando uma cidade sem mendicância, marginalidade e outras misérias humanas.

Como tais açudes, diversos ao longo do município, edificados por homens da região, possibilitam tamanha riqueza, entendo por demais oportuno uma reportagem a respeito do assunto, sugerindo a V.Sa. que, em sendo acolhida a proposta, procure, naquela cidade, os Srs. Ulysses Brito, Antônio Araújo, Rosalvo Magalhães, Antônio Cruz Leão, Antônio Bittencourt Cruz, Antônio Porto e Antônio Olindo Leão, todos conhecedores da matéria.

Certo em ter prestado, pelo menos, uma informação, subscrevo-me, atenciosamente,

Gilberto Martins Brito
Filho de Paramirim

Assista ao Programa que mostrou Paramirim no Globo Rural:

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2 Comentários Padrão+ Adicionar Comentário

  • Essa reportagem foi verdadeiramente, a “pedra fundamental” para a construção da barragem do Zabumbão, que se encontrava adormecida por 50 anos.

    Lembro-me bem desse episódio marcante. Fui eu o cicerone da equipe. Levei-os para as realizações das entrevistas e visitas na zona rural, bem como para saborear o delicioso feijão tropeiro no bar do saudoso amigo “Zé Inspetor” em Água Quente.

    Todas as noites Ivaci Matias (repórter) e Jorge dos Santos (editor) iam para minha casa na Praça Coração de Jesus, datilografar na minha máquina Olivette (galáxia de Gutemberg), – pois o computador ainda não tinha se espraiado pelo Brasil – o relatório da reportagem do dia.

    Concluída a barragem, o dilema da irrigação perdura, quiçá por mais meio século, pois o Governo do PT, como bem disse o Dr. Normando Viana: “Discursa para os pobres e Governa para os ricos”, não promovendo o tão necessário investimento no campo para a fixação do homem à terra.

    Em consequência temos: terras férteis, mas improdutivas por falta de políticas públicas para o setor e a consequente evasão habitacional do campo, pelo famigerado êxodo rural.

    E assim, percorremos a história do sertão, onde o mandacaru não mais fulora…, a chuva não mais chega ao sertão… e não tem mais menina para brinca de boneca…

    PT saudações!

  • Esta carta é bem escrita e é um documento muito importante para toda região porque a água da barragem atende Paramirim e outros municípios.
    Dizem que ele é durão e não é muito chegado nas festa. Mas tem preocupação com coisa importante.